Crônicas de Rodolpho Xavier publicadas no jornal A Alvorada.
Infância
Sei que não tens medo de despachos, pois são tantos os que tens visto que me lembro de um grande embrulho, quando eu era pequeno, e minha mãe recomendava que não mexesse naquilo…
Ela que lavava entretida nada viu, mas eu não me contive, puxei o embrulho para fora e encontrei além de outros preparos várias moedinhas de 10 réis, e me fui às tias Minas comprar pés-de-moleque.
Na volta quase apanhei: ela quis saber de onde eu tinha tirado o dinheiro, mas como tinha me ensinado a não mentir daquela me escapei.
A Alvorada, Ano XLVII, n.11, 26.03.1955, p. 01, crônica de Rodolpho Xavier.
Pobreza
Em 90, antes de irmos aprender o ofício de chapeleiro, andamos vendendo carnes e miúdos numa carroça indo buscá-los nas charqueadas do “Passo dos Negros”, ou nas charqueadas da “Costa” por compra-los mais baratos.
Sucede que, havia dias que chegávamos em casa cansados de bater nos lados da carroça para chamar a freguesia, e metade das costelas não eram vendidas porque a pobreza (a que comprava), fazia como a raposa com as uvas: olhava as costelas, cobiçava-as, mas não tinha 12 vinténs para comprá-las quando nos vendiam a 200 reis cada uma, nas charqueadas.
A Alvorada, Ano XXVII, n. 13, 09.04.1955, p. 01e 06, crônica de Rodolpho Xavier.
Irmão
Com Antônio Baobab, aos 13 anos de idade, acompanhávamos os ideais da Propaganda Republicana.
Portador de um caráter ilibado e inflexível, leal e sincero fez-se por si próprio trabalhando de dia e estudando até altas horas da noite e, provido de trabalhar alquebrado e doente, lecionava para ganhar um pão para o seu sustento.
As forças esgotaram-se-lhe e, recolhido ao lar de nossa velha mãe terminou os últimos dias.
A Alvorada, Ano XLVII, n. 15, 05.05.1955, p. 01, crônica de Rodolpho Xavier.
Brasil
Por todos os ângulos do Brasil, onde existem negros, há uma tal ou qual ojeriza contra a fundação dum centro homogêneo de vistas na consecução de reerguimento moral e intelectual de uma raça que desde a sua introdução como elemento escravo, e até o presente social e civicamente falando, tem vivido aviltada pelo simples fato de ter a “cor” mais adusta.
Por que motivos, os negros não podem fundar centros de cultura?
Por que motivos, os negros, não podem libertar-se da inferioridade em que são tidos por meio de seus próprios elementos?
Temos os mesmos deveres que todos os cidadãos brasileiros, porém nem sempre os mesmos direitos.
A Alvorada, Ano XXVI, n. 20, 21.05.1933, p. 02, crônica de Rodolpho Xavier.